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A Notícia Precisa

Cheias no Sul, a hora da reconstrução

Porto Alegre começa a viver depois de quase um mês debaixo d’água. As escolas são reabertas, vai ocorrer um grande operação de bombeamento das águas que ainda inundam o centro da cidade
(reforçado por bombas fornecidas por São Paulo, que as empregou na crise hídrica de 2015) , as empresas passam por limpeza e também se preparam para voltar à atividade da melhor forma possível. As autoridades não podem se esquecer da advertência da Fiergs (Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul), de que de cada dez negócios apenas um sobreviveu e os demais estiveram debaixo das águas barrentas. Não ignorem que é preciso adotar procedimentos especiais para que as empresas resistam ao desembolso da inatividade e possam readquirir o ritmo de trabalho. Os empresários gaúchos esperam nesse momento algo como a legislação da época da pandemia, que os permitiu flexibilizar o trabalho, antecipar férias e tomar outras providências que lhe dêem fôlego. Já pediram ao ministro do Trabalho e agora esperam as med idas nessa direção. Se não vierem, há o risco de cessarem 3 milhões de empregos naquele Estado. O vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro da Indústria, Comércio e Desenvolvimento, já recebeu em audiência o relatório dos industriais gaúchos e de pronto acionou os mecanismos do seu ministérios. É preciso, no entanto, que com a mesma presteza, outros setores do governo também se alinhem na tarefa de socorrer o agronegócio, os prestadores de serviços e o cidadão comum que perdeu todos os seus bens. Só assim teremos o Estado novamente íntegro e produtivo.
Enquanto os gaúchos já podem vislumbrar a luz no fim do túnel, os catarinenses é que agora enfrentam a tormenta. Na tarde e noite do domingo, já haviam 800 desabrigados pela enchente, em 20 municipios. O rio Itajaí-Açu estava com as águas a 9,06 metros acima do seu nível normal. Consequências dos 217 milímetros de chuva – metade do previsto para todo o mês – caídos em apenas 48 horas. Cinco abrigos foram abertos para recolher os desalojados e já acolhiam 467 deles.
A Defesa Civil e as prefeituras advertiram a população para a possibilidade de deslizamentos e outros incidentes decorrente do alto volume das águas, que já levou o governo do Estado a decretar estado de emergência e acionar os mecanismos de socorro da população. As cheias constituem problema antigo de Santa Catarina. Existem registros de que ocorrem desde 1855 (ou até antes). Certamente a questão agravou-se com o passar dos anos e agora poderá ter novos contornos decorrentes da alteração climática, a mesma que assola o Rio Grande do Sul.
Tivemos pelo menos uma semana de negociações das autoridades sobre os problemas em solo gaucho. Espera-se agora a tomada de providências que possam diminuir o sofrimento da população atingida. E que, ao lado do socorro haja também a presença firme das autoridades de segurança para evitar saques, assaltos, seqüestros e outros ilícito, como o fogo ateado a dois ônibus, na noite do domingo, em Porto Alegre. Os desordeiros e criminosos têm de ser contidos para não agravarem ainda mais o sofrimento da população e dificultar a volta à normalidade.
O quadro caótico enseja muitas reflexões – algumas corretas e outras simplemente alarmistas – que devem ser levadas em consideração. É preciso, ao lado do restabelecimento dos centros urbanos, recuperar as estradas para que a safra riograndense (especialmente de arroz) possa ser transportada aos demais Estados, onde estão seus centros consumidores. As estradas e ferrovias também devem garantir o abastecimento do próprio Estado. É preciso fazer o possível, no menor tempo, para a volta da fluidez nas relações de RGS e SC com o resto do País.
Viu-se nesses dias de tormenta, afirmações de que é preciso diversificar a produção do agronegócio – caso do arroz – para evitar sua concentração em apenas uma região. É algo a se pensar e, se possível, realizar. Da mesma forma que é preciso adotar medidas corretivas e preventivas para evitar as cheias e principalmente os acidentes representados por estouro de barragens, deslizamento de encostas e outros acidentes. São coisas previsíveis que devem ser tratadas nas épocas de seca para que na próxima concentração das águas não se repitam os incidentes. Isso nos leva à conclusão de que o Brasil necessita, com toda urgência, de um plano de contenção hídrica. Isso já foi executado em diferentes partes do planeta – especialmente nos países desenvolvidos – e os técnico s brasileiros da área conhecem bem. Mas é necessário investimentos e políticas de longo prazo. Não é obra para se executar num governo mas em sucessivos mandatos, más é crucial que se iniciem no menor espaço de tempo. Do contrário, os prejuízos e o sofrimento da população serão frequentes e infinitos.
No começo dos anos 70, houve a tentativa de federalizar a técnica e estadualizar a prestação de serviços de água e esgoto para que se despoluísse os rios e se aproveitasse convenientemente os recursos hídricos. O plano se desvituou porque muitos municípios fizeram questão de continuar executando os serviços. Hoje as companhias estaduais de saneamento – como a paulista Sabesp – estão em vias de privatização e temos um grande passivo de esgotos não tratados lançados dentro da calha dos rios. É preciso cuidar de tudo isso. Uma obra gigantesca, mas que tem de ser começada para um dia – nós ou a futura geração – tê-la concluída e oferecendo segurança, conforto e saúde à população.
O problema das cheias – Rio Grande do Sul e Santa Catarina – interessa a todo o País. Respeitadas as diferenças de topografia, clima e outras variáveis regionais, tudo aquilo que se aplicar nos dois Estados já impactado poderá, em maior ou menor proporção, ser útil aos demais quando o problema bater às suas portas. Mexam-se todos, de preferência antes da próxima inundação…

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
tenentedirceu@terra.com.br