Uma reflexão necessária para quem estuda, trabalha e batalha por um Brasil digno
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Nós, brasileiros, somos um poço profundo de esperanças, ainda que nada recebamos senão lama.
Lutamos diariamente para obter com dignidade nosso sustento e sustentamos uma pesada estrutura burocrática que nada nos dá em troca; nos esmaga e tripudia.
Nos mobilizamos, como ninguém em todo o mundo, para derrubar governos, renovar parlamentos e reivindicar reformas, sem, no entanto, por em risco a democracia.
Fazemos uso da soberania popular com regularidade, ordem e civilidade impecáveis, sempre buscando mudanças e renovação.
Embora sistematicamente traídos, a cada legislatura, a cada mandato, sentimos bater no rosto a leve brisa da transformação, cientes que o furacão que desejamos ainda está por vir.
O que demandamos, acima de tudo, é um contínuo e renovado Sentido de Nação.
A grande revolução
No início deste século, o Sentido de Nação surgiu com a indignação geral, manifestada nas ruas em 2013. Esse sentido pôs o País na frente do espelho, para constatar que a face ali exposta não era a nossa.
Ficou estampado, nas ruas e praças, o divórcio entre o povo e o poder – que deveria ser exercido por ele e em nome dele.
Esse divórcio motivou profundas alterações nos instrumentos de controle judiciário sobre a Administração – reduzindo sensivelmente o espaço da impunidade. Porém, ampliou o espaço da judicialização na Administração e na política.
Em seguida veio o impeachment de uma mandatária inepta. Uma operação de combate à corrupção como nunca antes vista, e a segregação de inúmeras ratazanas para o lixo, o opróbio e o limbo da vergonha.
Seguiu-se um período de reformas e um mandato populista à direita, pleno de esperanças – mas que também produziu frustrações e contradições.
Em todo esse período de transformações, as redes sociais e a comunicação digital, nos libertaram da corrompida e cooptada mídia mainstream, composta por acólitos do establishment e áulicos de plantão.
A volta dos que não foram
Ocorre, porém, que o esquema criminoso de poder, em função das procelas da burocracia judiciária – propositadamente erigida para nada resolver, sobreviveu à onda de renovação e se recompôs.
Os ratos retornaram, carregando consigo lama e limbo. Cooptaram quem poderia julgá-los e corromperam quem poderia denunciá-los em público.
Num processo pontuado por intervenções judiciais, um estamento de investidos sem voto conduziu um processo conturbado de “modulação” da Soberania Popular. Assim, deturparam sobremaneira o sentido das eleições em 2022, criminalizando até mesmo a crítica ao processo.
O resultado foi notório: o rosto da Nação não se viu e não se vê refletido na estrutura que nos governa. O resultado é o boicote, o descrédito e o desprezo cotidiano àquela gente postada no poder, em Brasília.
Assim, a busca por nossa verdadeira imagem permanece, seguindo o rito de Sísifo.
O eterno rolar de pedra acima.. me faz refletir sobre a importância de lutarmos pela dignidade – nossa e do Brasil que nós diariamente construímos.
O eixo do mal
Segundo o Banco Mundial, o caso envolvendo governos, empreiteiras e a operação lava-jato, expôs o maior fenômeno de corrupção da história mundial.
Graças à Lava-Jato, pôde-se calcular que, por baixo, nos governos FHC-LULA-LULA-DILMA o Brasil foi lesado no valor equivalente a um PIB – produto interno bruto, que é a medida da dedicação, do suor e da riqueza economicamente considerada de nosso país. Ou seja, nós – o povo brasileiro, fomos roubados no equivalente a tudo o que construímos.
Centenas de bilhões de reais, surrupiados de todos nós, foram distribuídos para ditaduras de outros países, bancos internacionais, empreiteiras, políticos, magistrados, agentes públicos de toda ordem, marginais por profissão e empresários.
Ethos anthropos daimon – o caráter do homem é seu destino, vaticina Heraclito.
O mal permaneceu, como dito. Manteve-se incrustrado na Administração, instalado no deep state e sustentado pelo establishment.
É fato: O estamento podre do Estado Brasileiro optou pelo apagão moral.
O mal está estampado no rosto, nos olhos, posturas e gestos da gente ordinária que se instalou no poder, eleita, nomeada e investida, com a própria alma amarrada ao inferno.
A opção pelo mal destrói o caráter, estraçalha a alma e deforma a personalidade do indivíduo.
No caso brasileiro, o apagão moral se assenhorou do País pela cúpula do Estado – emporcalhando os escaninhos da Administração e atraindo os fracos de caráter.
O eixo do mal perspassa o Estado brasileiro, estimulando a explosão da criminalidade ordinária no País. É a aliança da intelectualidade sem moral com o lumpesinato sem valores.
Esse eixo do mal é notoriamente rejeitado pelo povo – “extrato da população interessado no progresso econômico e social da Nação”, como bem conceituou Nelson Werneck Sodré.
Pudera. Somos um povo que sabiamente rejeita o crime, condena o mal e busca sempre a dignidade.
Esta a razão do eixo do mal buscar destruir a capacidade orgânica de mobilização popular – seja intentando censurar as redes e meios de intercomunicação social cibernéticos; seja promovendo uma gigantesca onda de intimidação geral e impunidade seletiva – com a prisão de cidadãos comuns e liberação sistemática de todo tipo de bandidagem.
Buscam, os agentes do mal, desfazer meticulosamente o bem feito, para consolidar o malfeito.
As ratazanas que apavoravam o personagem Winston Smith, nas sessões de tortura descritas na distopia de George Orwell, “1984”, saíram da ficção e, agora, aqui, vestem toga, ternos de boutique e uniformes lotados de tampinhas. Tornaram a “novilíngua” e o “duplipensar”, instrumentos de sua medrosa jurisprudência…
As ratazanas da República
As ratazanas empesteiam o ambiente pretensamente elitizado do Brasil. Gente ordinária que fede tanto quanto ostenta. O dinheiro podre e o poder corrompido formam o ecossistema que os governa.
O exercício da Soberania Popular incomoda essa gente. Por isso a busca insistente por restringir a liberdade de expressão e o livre debate.
Ciente do desprezo que a opinião pública lhe dedica , o eixo do mal quer a supressão da liberdade de manifestação. Quer destruir o espelho social que o confronta com a propria deformidade.
Os canalhas da República miram a Soberania Popular.
Como ainda não conseguiram suprimí-la, tratam de restringir o exercício da soberania popular… sob o pretexto de “defendê-la”. Esse o sentido da progressiva restrição à propaganda eleitoral, a censura ao debate e à livre expressão, a burocratização fiscal e a judicialização quase integral das campanhas eleitorais. Gente podre e pobre de espírito dificultando sobremaneira o surgimento de novas lideranças, moendo a indignação e deformando a cidadania, inclusive promovendo a progressiva redução e empobrecimento do período de disputa eleitoral (hoje reduzido a pouco menos de três meses).
Mas os fatos falam mais alto que o proselitismo comprado dos meios de comunicação. O Brasil não é feito pelos ratos. É, sim, construído pela brava gente brasileira.
A Brava Gente Brasileira
O Brasil se constrói pelas mãos das pessoas de bem. Gente que madruga, enfrenta fila, trabalha, educa e cria.
O Brasil se fez e se faz pela gente humilde, séria, que enfrenta corajosamente os insetos aboletados na burocracia insensível.
O Brasil que vale a pena não desponta nos palácios de governo, parlamento e justiça, nos eventos comprados a peso de ouro em academias no exterior, na casa dos “ricos sem causa”, na Flórida, ou nos “condomínios da vergonha”, em Portugal.
O país amado é composto pela brava gente que resiste e supera a violência urbana, enfrenta a hipocrisia e ignora o abandono. Gente que crê, tem fé, acredita e reza; forma os filhos cristãos, os ensina a serem bons cidadãos, pais de família e, mesmo nas áreas mais violentas dos centros urbanos; vai aos cultos evangélicos, frequenta as igrejas e comparece às missas católicas, busca conforto espiritual no kardecismo e no sincretismo religioso. Gente que prega para si e para os outros a moral sem adjetivos.
Esse Brasil Cristão, do bem, forma a esmagadora maioria. Aparentemente silenciosa, essa maioria compõe o sangue que corre nas veias da Nação .
Um testemunho
A complexidade da vida e a sofisticação das atividades parecem querer nos misturar a todos. Mas não é o que ocorre.
Posso dar testemunho disso.
Fui espectador engajado (parafraseando Raymond Aron). Inevitavelmente, por força das obrigações, não foram poucos os “desviados” que cruzaram meu caminho.
As sensações desses contatos foram marcantes – responsáveis por mudanças sensíveis na minha conduta corporativa e social – principalmente no que tange ao desapego.
Lembro de posturas e falas, diálogos e arrogâncias. Lições de “como são as coisas”, ministradas por deslumbrados com o poder efêmero, bajuladores de plantão, operadores de maçanetas de antessalas e engenheiros de obras feitas. “Lições” de “business as usual” proferidas em solenidades, staff meetings e rodas de coquetéis regadas a vinho, whisky e hipocrisia, onde bobagens fenomenais eram ditas como se fossem dogmas bíblicos.
Várias foram as vezes em que expressei meu desprezo pelas figuras, pelo assunto e… pelo meio. Paguei preços elevados por isso – sem nunca duvidar da própria superioridade moral.
Por adquirida sabedoria, percebi que sempre havia espaço para o bem e para coisas construtivas. Espaços por onde a dignidade pudesse respirar.
Na via da proatividade, pude enveredar e sobreviver com dignidade.
Assim, eu e muitos outros – de fato a maioria, tratamos de cultivar pérolas e, também, resgatar as pérolas eventualmente jogadas aos porcos, sem nos deixar contaminar pelos excrementos. Algo bíblico – essencial para quem se presta a servir ao bem comum.
Sempre há oportunidade para fazer o bem. Quando a porta da frente se abre, trate de executar um serviço sério – e jamais saia pelos fundos.
Por essas e outras, devemos sempre tirar alguns minutos, ou horas, no dia-a-dia, para uma reflexão.
Um convite à reflexão
Neste período de muitas mudanças, convido as pessoas que enxergam o mundo colorido e não em preto e branco; que não cultivam o ódio, nem o rancor e, sim, buscam a compreensão do todo, para que reflitam.
Tratamos de nos renovar todos os dias. Renovar as preces, as esperanças e a fé. Assim, acordamos mais leves, determinados e confiantes.
Se nos renovamos, não devemos confiar nossa esperança nos “salvadores da pátria” de plantão. Devemos isto sim, confiar em nós próprios, cientes do que somos – cônscios de nossa formação familiar, plenos da sabedoria que adquirimos com o passar da vida.
Lutamos pela educação do nosso povo, mas sabemos sobretudo que devemos educar pelo exemplo. É o exemplo que nos forma e forma nossos filhos.
É na renovação que teremos esperança de um Brasil melhor. É na confiança própria de cada um de nós, naquilo que somos e naquilo que acreditamos, que construímos o Sentido de Nação.
No momento que assumirmos nossa superioridade moral, a dignidade do ato bastará para romper o cerco dos fracos de caráter, permitindo à Nação realizar sua grandeza – de fato e de alma.
Dignidade sempre! E acima de tudo!
Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Diretor da AICA – Agência de Inteligência Corporativa e Ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados, É Vice-Presidente e Diretor Jurídico da API – Associação Paulista de Imprensa. Editor do Portal Ambiente Legal e do blog The Eagle View.
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